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quinta-feira, 13 de outubro de 2011

O casamento entre democracia e capitalismo acabou

Zizek: o casamento entre democracia e capitalismo acabou

O filósofo e escritor esloveno Slavoj Zizek visitou a acampamento do movimento Ocupar Wall Street, no parque Zuccotti, em Nova York e falou aos manifestantes. “Estamos testemunhando como o sistema está se autodestruindo. "Quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou". Leia a íntegra do pronunciamento de Zizek.

Durante o crash financeiro de 2008, foi destruída mais propriedade privada, ganha com dificuldades, do que se todos nós aqui estivéssemos a destruí-la dia e noite durante semanas. Dizem que somos sonhadores, mas os verdadeiros sonhadores são aqueles que pensam que as coisas podem continuar indefinidamente da mesma forma.

Não somos sonhadores. Somos o despertar de um sonho que está se transformando num pesadelo. Não estamos destruindo coisa alguma. Estamos apenas testemunhando como o sistema está se autodestruindo.

Todos conhecemos a cena clássica do desenho animado: o coiote chega à beira do precipício, e continua a andar, ignorando o fato de que não há nada por baixo dele. Somente quando olha para baixo e toma consciência de que não há nada, cai. É isto que estamos fazendo aqui.

Estamos a dizer aos rapazes de Wall Street: “hey, olhem para baixo!”

Em abril de 2011, o governo chinês proibiu, na TV, nos filmes e em romances, todas as histórias que falassem em realidade alternativa ou viagens no tempo. É um bom sinal para a China. Significa que as pessoas ainda sonham com alternativas, e por isso é preciso proibir este sonho. Aqui, não pensamos em proibições. Porque o sistema dominante tem oprimido até a nossa capacidade de sonhar.

Vejam os filmes a que assistimos o tempo todo. É fácil imaginar o fim do mundo, um asteróide destruir toda a vida e assim por diante. Mas não se pode imaginar o fim do capitalismo. O que estamos, então, a fazer aqui?

Deixem-me contar uma piada maravilhosa dos velhos tempos comunistas. Um fulano da Alemanha Oriental foi mandado para trabalhar na Sibéria. Ele sabia que o seu correio seria lido pelos censores, por isso disse aos amigos: “Vamos estabelecer um código. Se receberem uma carta minha escrita em tinta azul, será verdade o que estiver escrito; se estiver escrita em tinta vermelha, será falso”. Passado um mês, os amigos recebem uma primeira carta toda escrita em tinta azul. Dizia: “Tudo é maravilhoso aqui, as lojas estão cheias de boa comida, os cinemas exibem bons filmes do ocidente, os apartamentos são grandes e luxuosos, a única coisa que não se consegue comprar é tinta vermelha.”

É assim que vivemos – temos todas as liberdades que queremos, mas falta-nos a tinta vermelha, a linguagem para articular a nossa ausência de liberdade. A forma como nos ensinam a falar sobre a guerra, a liberdade, o terrorismo e assim por diante, falsifica a liberdade. E é isso que estamos a fazer aqui: dando tinta vermelha a todos nós.

Existe um perigo. Não nos apaixonemos por nós mesmos. É bom estar aqui, mas lembrem-se, os carnavais são baratos. O que importa é o dia seguinte, quando voltamos à vida normal. Haverá então novas oportunidades? Não quero que se lembrem destes dias assim: “Meu deus, como éramos jovens e foi lindo”.

Lembrem-se que a nossa mensagem principal é: temos de pensar em alternativas. A regra quebrou-se. Não vivemos no melhor mundo possível, mas há um longo caminho pela frente – estamos confrontados com questões realmente difíceis. Sabemos o que não queremos. Mas o que queremos? Que organização social pode substituir o capitalismo? Que tipo de novos líderes queremos?

Lembrem-se, o problema não é a corrupção ou a ganância, o problema é o sistema. Tenham cuidado, não só com os inimigos, mas também com os falsos amigos que já estão trabalhando para diluir este processo, do mesmo modo que quando se toma café sem cafeína, cerveja sem álcool, sorvete sem gordura.

Vão tentar transformar isso num protesto moral sem coração, um processo descafeinado. Mas o motivo de estarmos aqui é que já estamos fartos de um mundo onde se reciclam latas de coca-cola ou se toma um cappuccino italiano no Starbucks, para depois dar 1% às crianças que passam fome e fazer-nos sentir bem com isso. Depois de fazer outsourcing ao trabalho e à tortura, depois de as agências matrimoniais fazerem outsourcing da nossa vida amorosa, permitimos que até o nosso envolvimento político seja alvo de outsourcing. Queremos ele de volta.

Não somos comunistas, se o comunismo significa o sistema que entrou em colapso em 1990. Lembrem-se que hoje os comunistas são os capitalistas mais eficientes e implacáveis. Na China de hoje, temos um capitalismo que é ainda mais dinâmico do que o vosso capitalismo americano. Mas ele não precisa de democracia. O que significa que, quando criticarem o capitalismo, não se deixem chantagear pelos que vos acusam de ser contra a democracia. O casamento entre a democracia e o capitalismo acabou.

A mudança é possível. O que é que consideramos possível hoje? Basta seguir os meios de comunicação. Por um lado, na tecnologia e na sexualidade tudo parece ser possível. É possível viajar para a lua, tornar-se imortal através da biogenética. Pode-se ter sexo com animais ou qualquer outra coisa. Mas olhem para os terrenos da sociedade e da economia. Nestes, quase tudo é considerado impossível. Querem aumentar um pouco os impostos aos ricos? Eles dizem que é impossível. Perdemos competitividade. Querem mais dinheiro para a saúde? Eles dizem que é impossível, isso significaria um Estado totalitário. Algo tem de estar errado num mundo onde vos prometem ser imortais, mas em que não se pode gastar um pouco mais com cuidados de saúde.

Talvez devêssemos definir as nossas prioridades nesta questão. Não queremos um padrão de vida mais alto – queremos um melhor padrão de vida. O único sentido em que somos comunistas é que nos preocupamos com os bens comuns. Os bens comuns da natureza, os bens comuns do que é privatizado pela propriedade intelectual, os bens comuns da biogenética. Por isto e só por isto devemos lutar.

O comunismo falhou totalmente, mas o problema dos bens comuns permanece. Eles dizem-nos que não somos americanos, mas temos de lembrar uma coisa aos fundamentalistas conservadores, que afirmam que eles é que são realmente americanos. O que é o cristianismo? É o Espírito Santo. O que é o Espírito Santo? É uma comunidade igualitária de crentes que estão ligados pelo amor um pelo outro, e que só têm a sua própria liberdade e responsabilidade para este amor. Neste sentido, o Espírito Santo está aqui, agora, e lá em Wall Street estão os pagãos que adoram ídolos blasfemos.

Por isso, do que precisamos é de paciência. A única coisa que eu temo é que algum dia vamos todos voltar para casa, e vamos voltar a encontrar-nos uma vez por ano, para beber cerveja e recordar nostalgicamente como foi bom o tempo que passámos aqui. Prometam que não vai ser assim. Sabem que muitas vezes as pessoas desejam uma coisa, mas realmente não a querem. Não tenham medo de realmente querer o que desejam. Muito obrigado

Tradução de Luis Leiria

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A GERAÇÃO MIOJO


Miojo é um tipo de macarrão instantâneo, que fica pronto em três minutos, inventado por um japonês. Quando ele morreu em 2007, aos 96 anos, os usuários do produto fizeram "três minutos” de silêncio em sua homenagem. Preguiçosos, uni-vos!
Hoje há tipos humanos que se poderia chamar de "geração miojo”, pessoas que têm pressa em tudo que fazem, imediatistas e tratam tudo com uma superficialidade marcante. Têm pressa, mas não sabem para onde vão. Querem o sucesso, mas não sabem construí-lo. A felicidade não depende do que nos falta, mas do bom uso que fazemos do que temos.
Para esses, não existe mais o processo natural das coisas da vida, mas tudo é visto pelo enfoque do pragmático. Com isto, se acelera a quebra de muitos paradigmas, entre eles a ética do óbvio e o desleixo com o convívio. O pragmatismo é uma forma utilitarista de usar as coisas. Só tem valor aquilo que se pode tirar vantagens imediatas, o que é útil e que dá prazer. Dentro desse quadro a mídia noticiou que no México já se estuda a realização de casamentos com prazo de término fixado.
Hoje em dia, com a explosão dos fast-foodtudo ficou aparentemente mais prático, mas o convívio das pessoas foi para o espaço. Há cidades que não possuem um teatro ou uma biblioteca decente, mas possuem mais de um fast-food. Vai-se a essas lanchonetes modernas –em geral sob o impulso da ditadura infantil (os filhos impõem onde a família vai comer)– e nem se pede mais a comida pelo nome, mas por um número. A refeição vem num saco de papel ou em uma caixa de papelão. Ora, comida em saco é para cachorro e em caixa é para passarinho.
Antigamente a gente ia almoçar fora; levava uma hora para vir o alimento. Era um acontecimento! O bom do "comer fora” não é tanto a comida em si, mas a espera, o bate-papo, o convívio. Hoje muitos têm saudade do alimento feito em casa: vão aos restaurantes para comer "comida caseira”. Esta é uma das paranoias do século XXI.
Comer miojo não indica apenas a pessoa preguiçosa, mas revela um estilo apressado e provisório... Buscamos a cultura do miojo para tudo: na escola, na família, no amor, na amizade, no sexo. É tudo rápido, prático e descartável, mesmo que não seja tão bom. Nessa filosofia do provisório surgem as práticas de consumo. Os objetos, bens de uso, roupas, etc. são vistosos, mas de pouca duração. Bonitinhos mas ordinários.
As causas da depressão infantil, em geral estão no ambiente familiar desequilibrado. Crianças que vivem em carência afetiva tendem a ter depressão. Muitos têm como objetivo, o gozar a vida. E cabe perguntar: Você é totalmente feliz assim? A resposta, invariavelmente é não, devido à transitoriedade desse gozo.
Filosofar é indagar, é criar uma forma de pensamento que vá além do óbvio, é descobrir as coisas que estão além daquilo que aparentam ser. O mundo hoje, os sistemas gostam de apresentar pratos prontos, coisas acabadas, dogmatizadas, como um miojo: é só jogar na água quente e polvilhar com o molho que vai dar o sabor padrão.
Enquanto comida, embora apresentem uma variedade de opções que vai do frango à carne, calabresa e vegetais, todos os mijos tem o mesmo sabor. Assim é a vida de alguns: pensam que assumem opções, mas no fim fica tudo igual, sem muita chance de escolha. François Rabelais advertiu seus pares sobre o perigo de "... muitos que não puderam quando queriam, porque não quiseram quando deviam”. Esse alerta ressoa em nossos ouvidos moucos até hoje. Sua vida e seu mundo mudam quando você muda. Caso contrário, tudo recai naquela angústia existencial que Sartre chamou de náusea Por esta razão os consultórios dos analistas e as ruas estejam cheias de pessoas desestruturadas, sem identidade, e deprimidas. A capacidade de comprar bens, de consumir e de estar sempre com presas não as faz felizes.
O pequeno personagem de Exupéry reclama, em um de seus mais expressivos diálogos que os homens se acostumaram a comprar tudo pronto, por isso não tem amigos, pois não se vendem amigos em lojas...

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Antônio Mesquita Galvão
Doutor em Teologia Moral